“Os maiores problemas enfrentados hoje pelo mundo só poderão ser resolvidos se melhorarmos nossa compreensão do comportamento humano. […]”. Com essa frase, Skinner finaliza seu capítulo de introdução do livro Sobre o Behaviorismo (1974/2006). O sonho de Skinner, por trás de uma ciência do comportamento, não era a modificação de comportamento individual (como se pode parecer pelos delineamentos de pesquisa). Era o enfrentamento de grandes problemas sociais da humanidade.
Esse sonho me leva a pensar sobre como a Análise do Comportamento poderia contribuir em situações de tragédia, como a que ocorreu recentemente no Rio Grande do Sul. Por se tratar de um desastre “natural”, parece existir pouco espaço para olhares sobre o comportamento humano na discussão desse problema (se não considerarmos o acolhimento das vítimas e redução dos danos psicológicos em situações traumáticas). Desastres, porém, ocorrem em ambientes. Ambientes afetam e são afetados por organismos. Onde há organismos e ambientes, creio eu, sempre há algo a ser feito.
Analistas do Comportamento entendem como o comportamento humano é moldado pelo ambiente. Esse saber pode nos colocar em uma ótima posição para desenvolver tecnologias e estratégias para lidar com eventos catastróficos, tanto antes (prevenção) quanto durante (minimizar danos) e depois (recuperação).
No âmbito da prevenção, a análise funcional (ferramenta básica do analista do comportamento) pode nos dar uma luz sobre possíveis antecedentes e consequências que podem favorecer a adoção de medidas preventivas. Essas informações podem ser valiosas para o desenvolvimento de políticas públicas e estabelecimento de hábitos preventivos em nível comunitário. Apesar da conscientização ser importante, nós sabemos que “ter consciência” não é o suficiente para mudar nosso comportamento. Sabemos os riscos e prevemos os danos, mas agiremos a partir das contingências que nos são dadas.
Durante a ocorrência do desastre, ações imediatas são necessárias para garantir a segurança e minimizar danos. Naturalmente, é possível supor que alguns comportamentos de grupo são mais efetivos do que outros. O entendimento funcional sobre como pessoas respondem em situações de crise pode nos dar dicas para o desenvolvimento de estratégias e formas de comunicação eficazes para lidar com esses contextos.
Após o desastre, a Análise do Comportamento pode ir além do acolhimento e redução de crises emocionais. A partir dos princípios comportamentais básicos, é possível promover contingências que podem ajudar as comunidades a se reconstruir e se recuperar mais rapidamente. Isso se dá pela promoção de repertórios comportamentais voltados ao coletivo, visando à participação em atividades coletivas de reconstrução e suporte social.
Além de todas as possibilidades, a Análise do Comportamento pode nos ajudar a avaliar o que já está sendo feito. Programas governamentais, sociais e protocolos de prevenção de desastres podem ser beneficiados pelo olhar funcional do behaviorista radical. O ideal e o possível podem estar bem distantes entre si, e não é incomum que projetos saiam dos planos por falta de uma boa análise de contingências.
Quando deixamos de pensar nas possibilidades e nos voltamos à realidade, percebemos que as coisas não são fáceis. A Análise do Comportamento tem grande presença na clínica, mas pouco caminha em direção ao sonho skinneriano. E a implementação dessa ciência no enfrentamento de grandes problemas sociais da humanidade pode gerar uma série de outros desafios. Diante desse contexto, creio que nos cabe assumir uma postura pragmaticamente otimista. Se quisermos seguir o ideal de Skinner para sua ciência, tornemos as contingências favoráveis para nós mesmos.