“Aborrescente” vs adolescente: o olhar sobre as emoções do jovem

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Vivemos em uma cultura que frequentemente invalida as experiências internas, como as que comumente são chamadas de “sentimentos”, “vontades” e “desejos”. Isto ocorre independente da faixa etária, mas em especial com os adolescentes, geralmente ainda dependentes em diversas esferas de, por exemplo, seus responsáveis legais. Muitas vezes, eles são rotulados pejorativamente como “aborrecentes” – junção de “adolescente” com “aborrecimento”.

A invalidação das experiências internas do adolescente pode ocorrer por inúmeros motivos, como a crença de que as preocupações do adolescente são pequenas comparadas com os problemas de uma pessoa com mais anos de experiência. Pode ser que essa postura com o jovem seja recorrente em comparação com um adulto, pois este provavelmente já passou por diversas experiências de punição ao longo de sua história de vida quando expressou descontentamentos em determinados contextos – afinal, todo adulto foi um adolescente e experienciou momentos marcantes da vida pela primeira vez (como intriga com os pais ou sofrer por um grande amor), sentindo as emoções intensas e genuínas dessas situações. Como efeito da punição, a frequência em relatar (e não em sentir) essas emoções pode cair ou se cessar em certas situações.

A invalidação emocional pode vir em diferentes roupagens, como:

  • “Não seja tão negativo assim! Você só vê problema em tudo”;
  • “Para quê você está agindo assim? Tem gente com problemas muito maiores!”;
  • “Pensa positivo, assim fica melhor”;
  • “Moça bonita não chora”;
  • “Que besteira esse medo seu, não precisa disso”;
  • “Para de chorar por besteira”;
  • “Você está desse jeito, porque só fala disso! Tenta ser mais otimista”.

Algumas vezes, o conselheiro deste tipo pode ter a melhor intenção, tendo a urgência de eliminar de imediato o sofrimento do jovem. Porém, sem querer, pode acabar mais atrapalhando do que ajudando. Nessas situações de invalidação, os sentimentos de autoestima e de autoconfiança do jovem podem ficar abalados, além do repertório de resolução de problemas e de regulação emocional (ligados às habilidades de autonomia e independência) ficarem deficitários. O jovem pode aprender que o que sente é errado e não tem valor e é inferior sobre o outro; sua percepção sobre si e o mundo é deturpada; é incapaz de resolver problemas cotidianos ou de agir sobre o mundo com sucesso; pode apresentar dificuldade de se expressar – sendo esses efeitos uma fonte de sofrimento a curto e a longo prazo para o jovem.

Há alternativas para a prevenção e/ou remediação dos efeitos apresentados. Algumas possibilidades de validar a expressão interna dos adolescentes e ajudá-los a desenvolverem e fortalecerem sua autoestima, autoconfiança e a capacidade de resolver problemas podem ser:

  • É compreensível você se sentir assim, considerando as situações X e Y pelas quais passou. Não se culpe.
  • Consegue me dizer o que está sentindo?
  • O que você acha que essa emoção está querendo dizer para você?
  • A dor e a dificuldade de outras pessoas não invalidam ou diminuem a sua.
  • É importante que você expresse o que te incomodou para chegarmos um consenso. Vou te ouvir.
  • Você pode contar comigo para os momentos bons ou ruins. Qual a sua maior dificuldade para eu te ajudar a encontrar um melhor caminho?
  • Entendi que você acha “bobo” o motivo, mas, se você está assim, me parece que isso significa algo importante para você.
  • Sei que é difícil falar sobre assuntos dolorosos e você é corajoso por compartilhar comigo. Como uma pessoa mais experiente que já passou por isso, quero te ajudar a resolver esse impasse.
  • Reconheço que você está sentindo X e Y, apesar de não ter sido minha intenção deixá-la assim. Posso deixar mais claro: o que queria era W e Z.
  • Há muito tempo passei por essa situação também e consigo imaginar o quanto você esteja sofrendo. Estou aqui.
  • Tudo bem preferir ficar sozinha no quarto neste momento. Estarei aqui na cozinha caso precise de mim. Quero te ver bem.

Entre outras possibilidades.

Portanto, ter um olhar compreensivo, empático e acolhedor sobre o jovem se torna prudente, bem como os adultos se equiparem de habilidades para genuinamente validarem as experiências internas (o que não significa permitir/concordar com as ações deliberadamente). Estas práticas direcionam o jovem para o entendimento que o que é experienciado internamente não é errado ou inferior sobre o outro; o mundo não está contra ele, e sim junto. Além disso, caminha na direção de se sentir capaz para resolver problemas cotidianos, regular suas emoções e agir com sucesso sobre o mundo. A longo prazo, são altas as chances de observarmos um adulto socioemocionalmente saudável, independente e autônomo, perpassando o ensinamento ao longo de futuras gerações.

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Bibliografia

Banaco, R. A. (1995). Adolescentes e terapia comportamental. Em: B. Rangé (Org.) Psicoterapia comportamental e cognitiva: pesquisa, prática, aplicações e Problemas (pp. 143-148). São Paulo: Editorial Psy.

Turrell, S. L., & Bell, M. (2016). ACT for adolescents: Treating teens and adolescents in individual and group therapy. New Harbinger Publications.

Escrito por:

Amanda Viana dos Santos

Psicóloga pela PUC Goiás e mestra e doutoranda em Análise do Comportamento pela UEL. Docente no curso de Formação em Terapia Analítico-Comportamental Infantil do IBAC. Gerencia o Instagram @guiapraticodospequenos

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