O ano está começando e aposto que você já fez a sua lista de resoluções e metas para 2023.
Ótimo! É bom ter metas!
Eu já defini que quero ler 18 livros nesse ano. Vou fazer atividade física 3 vezes por semana e yoga todos os dias. Quero escrever os artigos para o Blog do IBAC com antecedência de um mês. Vou manter meu instagram profissional atualizado, com uma postagem por semana, pelo menos. E quero escrever um artigo ou um capítulo a cada dois meses.
Ufa!!
O grande problema das nossas metas e resoluções de ano novo é que nós costumamos esquecer de uma parte delas enquanto apagamos os incêndios do dia a dia, ao longo do ano. A realidade não nos ajuda.
E, além disso, existe uma tendência de superestimar nossa capacidade de realização e ignorar alguns elementos que podem estar no nosso caminho. É o que economistas comportamentais chamam de viés do otimismo.
Por exemplo, você vê um vídeo no Youtube mostrando como fazer uma receita de bolo, consertar uma liquidificador ou limpar um carro por dentro. No Youtube, o vídeo dura 7 minutos e a pessoa faz com a maior facilidade. Aí você pensa: se ele/a fez, eu consigo fazer também! E certamente consegue! Porém não nos mesmos 7 minutos que durou o vídeo, não sem uma grande preparação por trás, não sem algum treinamento e ajuda de outras pessoas, ou seja, coisas que o vídeo não mostra.
Quantas vezes você já viu isso na clínica? O cliente chega superanimado, cheio de planners e aplicativos para organizar a agenda, e se propõe a fazer tantas coisas no fim de semana, que só seriam viáveis em um mês inteiro de trabalho. Ou aquela pessoa que decide mudar de vida radicalmente, de uma vez por todas, e vai voltar para o inglês, iniciar aulas de forró, aprender a cozinhar, começar um novo hobby, até que ela perceba que. infelizmente, nem o orçamento nem a agenda comportam todas essas atividades de uma vez.
Ou você mesmo/a talvez considere que para estar na aula que começa às 9h, basta sair de casa ou ligar o computador (se a aula for online) às 8h55, ignorando com sucesso qualquer possibilidade de o computador travar, pegar trânsito, não ter vaga para estacionar, ou qualquer outro imprevisto que pode acontecer. Nessas situações talvez você acabe sentindo frustração, estresse, desânimo ou ansiedade, o que pode levar a desistir de ir para aula ou completar o projeto em que estava anteriormente empenhado/a.
Tali Sharot é uma pesquisadora que estuda o viés do otimismo (veja a palestra dela no TED Talks no final desse post). Ela define esse viés como a diferença entre a expectativa de uma pessoa e o resultado que se segue. De modo geral, as expectativas são melhores que a realidade, o que torna o viés otimista. Ela afirma que as pessoas costumam subestimar quanto tempo ou quanto dinheiro um projeto vai durar ou gastar. Pergunte a quem já fez uma reforma para conferir se o viés não aparece.
E não pense que esse viés é exclusivo de humanos que têm altas expectativas e pouca noção. Em um estudo, pesquisadores avaliaram como pássaros escolhiam alternativas com reforços atrasados ou imediatos, com estímulos sonoros que sinalizavam cada esquema em vigor. Um som mais longo indicava um reforçador atrasado, enquanto um som mais curto indicava um reforçador imediato disponível. Na fase de teste, os pesquisadores colocaram um som de média duração, ou seja, nem curto nem longo, e os pássaros precisavam fazer a escolha que indicasse o tipo de reforçador associado ao som. A maioria deles fez a escolha pela alternativa de reforçador imediato, que era a preferida. Ou seja, na dúvida, os pássaros optaram pela escolha que mais favorecia suas expectativas.
Eu não quero destituir você de suas resoluções e metas. Ao contrário. É bom e importante ter metas e essa é, inclusive, uma variável que entra para a definição clínica de estados depressivos, quando o indivíduo não consegue avaliar e pensar sobre o futuro e acha que nada mais vai dar certo.
Mas antes de se entregar ao otimismo desenfreado, pode ser interessante contrabalanceá-lo com outros mecanismos que ajudem você – e seu/sua cliente, se for o caso -, a se manter em suas metas.
Já sabendo que tendemos a não calcular bem as horas de um projeto, que tal deixar uma margem maior? Já sabendo que podemos estar muito confiantes que o trânsito estará tranquilo, que tal sair de casa com alguns minutos a mais de antecedência? Que tal pedir ajuda para um amigo para incentivar você a malhar quando você começar a faltar na academia? Ou permitir-se faltar uma vez ou outra e retomar seu projeto assim que for possível?
Talvez o otimismo coloque seres humanos em situações de risco, como “não vai acontecer comigo!”, “eu consigo sozinho”, e aumente as sensações de ansiedade quando se percebe que as coisas podem não dar certo.
Considerar o otimismo como um viés nos permite ter uma visão mais clara da realidade, das nossas vulnerabilidades e da atenção e da vigilância que precisamos desenvolver para ajudar a nos manter nas metas que nós mesmos escolhemos para a nossa vida. Ter a esperança como estratégia não é otimismo. É ilusão.
Desejo a você que em 2023 você seja muito otimista, conquiste suas metas e vá mais longe! E considere novas possibilidades e ajustes para se manter em suas resoluções quando estiver cansado/a ou ocupado/a demais para continuar.
Feliz 2023!
Para saber mais:
Bracha, A., Brown, D. J. (2012). Affective decision making: A theory of optimism bias. Games and Economic Behavior. Vol 75, 1, May 2012, 67-80. https://doi.org/10.1016/j.geb.2011.11.004
Park, T., Ju, I., Ohs, J. E., & Hinsley, A. (2021). Optimistic bias and preventive behavioral engagement in the context of COVID-19. Research in Social and Administrative Pharmacy, 17(1), 1859-1866. https://doi.org/10.1016/j.sapharm.2020.06.004
Sharot, T. (2011). The optimism bias. Current Biology, vol 21, 23, R941-R945. https://doi.org/10.1016/j.cub.2011.10.030