Reflexões de um analista do comportamento sobre a paternidade

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Entre todas as minhas postagens ao blog, esta é especial, pois abordará um tema muito pessoal. Recentemente, experimentei uma transformação significativa em minha vida: tornei-me pai. Meu filho, Caio, está atualmente com sete semanas de vida. Apesar da avalanche de emoções que um evento tão significativo como este pode desencadear, minha formação como analista do comportamento me impulsiona a racionalizar e analisar acerca da minha nova realidade. Neste texto, compartilharei algumas reflexões e conclusões que emergiram dessa análise, na esperança de que outros pais possam se identificar com minhas experiências.

Antes de seguir, é importante esclarecer que o fato de ter me tornado pai e ser um analista do comportamento não me confere, de modo algum, expertise no tema da paternidade. Que fique claro: se você está em busca de orientações sobre cuidados parentais, lamento informar que está no lugar errado. A literatura e a internet contam com indivíduos muito mais experientes do que eu, capazes de oferecer conselhos muito mais valiosos do que eu poderia conceber. Sou, na verdade, um mero aprendiz, esforçando-me para me adaptar às novas contingências.

Dentre os inúmeros processos comportamentais que vivenciamos com a experiência da paternidade, o que mais chamou a minha atenção foi o controle por regras. De acordo com Skinner (1969/1984), regras são descrições verbais de contingências, isto é, descrevem relações do tipo “se… então.” Em alguns casos, o controle por regras pode economizar o contato direto com as contingências, de maneira que o comportamento passa a ficar sob controle da contingência descrita na regra, mesmo que o indivíduo nunca tenha sido exposto a elas. Dentre as vantagens do comportamento governado por regras – em comparação com o comportamento modelado por contingências -, Skinner cita a sua maior velocidade de aprendizagem e a evitação de contingências possivelmente aversivas.

O que isso tem a ver com a paternidade? Vou explicar. Ainda durante a gestação, ao comunicarmos a alguém que em breve seremos pais, somos imediatamente bombardeados por uma miríade de regras. É curioso observar quão frequentemente as pessoas assumem o papel de “especialistas” nesse assunto, prontas para fornecer “conselhos valiosos”. O intrigante é que não precisamos solicitá-los; o simples anúncio de que estamos prestes a nos tornar pais é suficiente para desencadear uma enxurrada delas. Não encaro isso como um problema em si. Como mencionei anteriormente, não tenho dúvidas de que muitas pessoas possuem um conhecimento mais aprofundado do que eu sobre o tema, o que as capacita a formular regras que descrevem com precisão as contingências. O verdadeiro problema é a natureza das regras emitidas, e o que exatamente estas pessoas esperam que eu faça com elas.

Considero que as regras problemáticas são aquelas que descrevem contingências aversivas sobre as quais temos pouco ou nenhum controle. Alguns exemplos que ouvi incluem:

  • “Você será pai? Prepare o bolso!”
  • “Aproveite para dormir agora!” (como se fosse possível “armazenar” o sono).
  • “Cuidar de bebê dá muito trabalho.”
  • “Quando seu filho nascer, você será um estranho para ele.”

Para a mãe, infelizmente, o cenário é infinitamente pior. Alguns exemplos de regras que ouvimos incluem:

  • “Não conte para ninguém que está grávida e não se apegue ao bebê ainda; é normal a mulher abortar nas primeiras semanas.”
  • “Tenha cuidado com a sua rotina de exercícios, para não sofrer aborto espontâneo.”
  • “A amamentação será complexa e dolorosa.”
  • “Nas últimas semanas de gestação, você ficará inchada, cansada constantemente, com dores no cóccix e será difícil dormir.”
  • “Suas veias poderão estourar durante o parto, causando hemorragia.”
  • “O parto natural é doloroso e pode durar até três dias.”
  • “Nos primeiros dias, a experiência do puerpério te deixará desnutrida.”
  • “Sua casa ficará uma bagunça.”
  • “Você ficará descuidada, com unhas e cabelo a fazer.”
  • “O pós-operatório do parto cesárea é doloroso e sua recuperação será demorada.”
  • “Retornar ao trabalho será difícil.”
  • “Seu corpo nunca mais será o mesmo.”

Aqueles que já passaram pela experiência da paternidade ou maternidade certamente poderão se recordar de terem ouvido algumas, se não a maioria, das regras que mencionei acima. A frequência com que nos deparamos com elas é surpreendente; uma simples “conversa de elevador” costuma ser suficiente para que elas surjam. É interessante observar que a maioria dessas regras descreve contingências aversivas, muitas das quais inevitáveis. Não tenho a intenção, neste contexto, de oferecer uma análise funcional do comportamento das pessoas que emitem essas regras; talvez isso seja explorado em outro momento. A minha reflexão centra-se no fato de que, ao não sugerirem comportamentos que possam evitar ou amenizar o impacto das contingências aversivas, essas regras têm pouco valor prático para quem as escuta, além de contribuírem para tornar a experiência consideravelmente ansiogênica.

É importante considerar também que, independentemente da expertise que alguém possa ter no assunto, cada experiência é única, o que torna as previsões que possamos fazer questionáveis.

Vamos considerar o meu caso como exemplo. Devido às regras que ouvi, durante toda a gestação, antecipei o pior. Felizmente, a realidade revelou-se muito mais positiva do que eu poderia imaginar. A gestação foi uma experiência incrível e sem complicações. Embora quiséssemos um parto natural, a equipe médica recomendou a cesárea devido à presença de mecônio no líquido amniótico durante o trabalho de parto. O parto, entretanto, transcorreu tranquilamente, e a recuperação do pós-parto foi surpreendentemente rápida, mesmo sendo uma cesárea. Meu filho dorme muito bem, acordando geralmente apenas uma vez durante a noite para mamar, o que praticamente não afeta nosso sono. Aliás, ele mama muito bem, e a amamentação não causa nenhum desconforto à mãe. Conseguimos manter a casa organizada e realizar as tarefas domésticas normalmente. Sim, cuidar dele demanda um esforço, como trocar fraldas, dar banho, fazer arrotar e ajudar nas dores de cólica esporádicas no final da tarde. Brinco, de forma descontraída, que cuidar dele às vezes se assemelha a correr uma maratona, mas com a sensação de vencer a corrida.

Atualmente, ao compartilhar com as pessoas que minha experiência da paternidade não está sendo um “bicho de sete cabeças”, geralmente ouço que isso se deve ao fato de ainda estar no início e que as coisas ainda vão piorar (outra regra!). Talvez essas pessoas tenham razão. No entanto, agora prefiro ignorar o que os outros têm a dizer sobre o assunto. Escolho me expor às contingências.

Nenhum comentário que ouvi, mesmo entre os mais otimistas, foi capaz de antecipar o quão reforçador seria a experiência de ser pai. O medo e a ansiedade que cultivei ao longo da gestação se transformaram na mais elevada das expectativas. É disso que minha vida se trata agora, e eu espero que continue assim.

Caio Medeiros (SR+)

Referências

Skinner, B. F. (1969/1984). Contingências de Reforço: Uma Análise Teórica. (R. Moreno, trad.). São Paulo: Abril Cultural.

Escrito por:

Fabio Medeiros

Psicólogo (UniCEUB), mestre em Ciências do Comportamento (UnB) e doutorando em Ciencia del Comportamiento (Universidad Veracruzana – México). Atua como docente de graduação e pós-graduação em instituições de ensino superior e psicólogo clínico em consultório particular. Principais interesses acadêmicos: Comportamento humano e linguagem; Questões conceituais em Psicologia; Terapia Analítico-Comportamental.

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