Quando a FAP transcende as barreiras do consultório: encontros Viva com Consciência, Coragem e Amor

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Com um treino behaviorista, consciente dos meus T1s e T2s1, sempre lúcida quanto a minha história de aquisição e manutenção deles (gratidão aos meus terapeutas por isso), tenho como um forte valor de vida o de ajudar nas lutas e contribuir com o desenvolvimento das pessoas. Prover o que os outros precisam foi algo que desde a tenra idade fez parte de meus repertórios comportamentais. Nessa trajetória do “servir” ao longo da adolescência, curtia um trabalho voluntário de finais de semana na escola. Aos 15 anos passava temporadas em aldeias indígenas me contribuindo com aquela população em situação de vulnerabilidade e, aos 18, passei um ano no Amazonas (morando em um barco) em trabalho voluntário. Até que cheguei à Psicologia e a fome se uniu com a vontade de comer.

Essa breve trajetória justifica porque o encontro com o projeto Viva com Consciência, Coragem e Amor fez tanto sentido na minha vida. Sempre adorei a clínica, a FAP foi, dentre as propostas psicoterapêuticas, aquela que mais se encaixou no meu propósito de vida. Ao mesmo tempo em que era apaixonada por relações humanas, tinha consciência de que eram um grande desafio. Mas, se a FAP tinha me ajudado tanto nisso, ela também poderia ser uma alternativa nas tantas lutas que vivenciava com meus clientes. E foi! E tem sido.

Ao mesmo tempo, as experiências do passado ainda me faziam sentir limitada em relação a esse formato um a um do consultório. Muito embora eu tenha a certeza de que amo o que faço, ainda me sentia bem limitada com esse alcance, em termos de estabelecer relações íntimas e genuínas, que possam fluir como curativas para tantos pacientes e seres humanos.

Nessa pegada, um dia apareceu aqui em Brasília, com o Paulão, um encontro chamado Meetup ACL (Sigla do inglês para Consciência, Coragem e Amor: Awareness, Courage and Love). Tinha relação com a FAP, mas era diferente. Era em grupo, mas não era psicoterapia de grupo. Pessoas eram ensinadas a se vulnerabilizarem e se apoiarem, saindo de sua zona de conforto, exercendo autocuidado, mas não se tratava psicoterapia. Como assim?

Confesso que o primeiro momento foi bem confuso, parecia até um workshop vivencial da FAP, daqueles que o trator passa por cima (talvez em menor escala, até mesmo pelo tempo reduzido), mas que, apesar de toda moída, eu nunca me senti tão bem. Os que já passaram por isso vão saber. Os que ainda não vivenciaram, incentivo a experiência.

Enfim, saí bem animada e de repente passei a participar de um grupo maior. Pessoas do mundo inteiro sendo conduzidas pela Mavis Tsai (co-criadora da proposta da FAP) em encontros mensais para, posteriormente, conduzirem em suas cidades seus próprios encontros. Encontros que dispensavam a condição de ser psicólogo ou paciente para participação, e, por isso, ampliavam o número de pessoas alcançadas. Mas que tinham um objetivo ao mesmo tempo tão simples e importante: promover conexão social.

Mas, de fato, o que é este projeto, “Viva com Consciência, Coragem e Amor”? Trata-se de uma proposta de intervenção social que busca trazer ao público em geral conceitos da Psicoterapia Analítico Funcional. Justifica-se pela necessidade de intervenção em relação aos principais problemas de saúde pública gerados pelo déficit em conexão social. Vale lembrar que atualmente o isolamento social atua como fator de risco na vida da população, podendo ser tão danoso quanto outros fatores como o tabagismo (Holt-Lunstad & Smith, 2012), obesidade (Holt-Lunstad, Smith, & Layton, 2010) e alcoolismo.

O principal objetivo dos encontros é proporcionar um espaço que seja propício à promoção de interações sociais mais autênticas, genuínas, presentes e que, por isso, também possam ser curativas (Tsai, 2018). Eles têm duração de cerca de uma hora e trinta minutos. Iniciam-se com boas vindas, seguido de uma breve explicação do projeto (possui representantes em 67 cidades, 23 países e 5 continentes). Antes do início do encontro propriamente dito são esclarecidas algumas posturas importantes para o melhor aproveitamento do grupo. É delimitando que não se trata de uma terapia de grupo, mas que é importante que se respeite um sigilo daquilo que pode ser dito ao longo do encontro para que possa ser construído um ambiente seguro para as pessoas se vulnerabilizarem. Posteriormente é dado seguimento à temática do dia, seguido de uma atividade de meditação ou um vídeo. Atividades que favorecem a interação social são promovidas com a finalidade de levar os participantes a praticarem, dentro da temática escolhida, mais intimidade uns com os outros. As pessoas são incentivadas a ouvir de modo caloroso e gentil, não dar conselhos e não julgar.

Os líderes de capítulo promovem os encontros em suas cidades e participam do treinamento online mensal. São incentivados a compartilhar com o grupo maior suas experiências na condução de modo a se apoiarem mutuamente nos desafios enfrentados. Os encontros e a condução são abertos a quem se interessar a promover essa ideia. Ao término deles, os participantes são incentivados a responder um questionário de feedback, com a finalidade de contribuir com o preparo dos próximos. A frequência de cada encontro é mensal.

Assim, é formada uma rede de apoio mundial que se conecta em prol de relações mais saudáveis, em que eu, particularmente, passei a me balançar. Mesmo nela, os objetivos podem ser bem distintos, o público alvo pode ser mais informal com encontros menores ou mais formal em ambientes acadêmicos. A ferramenta é flexível para que cada um possa encontrar sua própria praia na maneira de condução. No ano passado, por exemplo, em uma vivência intensa de Psicoterapia Comunitária Integrativa, achei as propostas tão uníssonas, que passamos a inserir em nossos encontros algumas atividades experienciais dessa proposta e o resultado foi muito produtivo.

Hoje, o valor de servir ganhou peso no sentido de fazer parte dessa rede em prol de relações mais saudáveis, que muitas vezes nadam contra a corrente de um mundo permeado por relações de competição, efêmeras, pautado em likes e mediadas mais pela conexão do wifi que pela conexão de olhares.

Se fez sentido para você, convido a experimentar estar conosco nessa caminha de Consciência, Coragem e Amor! Venha para um encontro, e quem sabe, promova um também.

1 Sigla utilizada pela Psicoterapia Analítico Funcional para (1) Comportamentos-problema do terapeuta (T1), que o atrapalham no trabalho terapêutico com seu cliente e Comportamentos de progresso do terapeuta (T2), que o auxiliam nesse mesmo trabalho terapêutico.

Escrito por:

Ana Paula Moraes

Coordenadora e docente do curso de Psicoterapia Analítica Funcional (FAP) pelo IBAC. Mestra em Ciências do Comportamento pela Universidade de Brasília (UNB)

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